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06/04/2015 15h06
MEMÓRIAS DE AGUINHAS - Relatório do Eng. Benjamin Jacob sobre o Parque das Águas (1904)

Ilustração: Pavilhão das Fontes - Lambari (MG), início dos anos 1900.


SUMÁRIO

  1. Introdução

  2. O relatório de Benjamin Jacob, Engenheiro Fiscal das Águas Minerais

  3. As fontes

  4. O parque

  5. O estabelecimento hidroterápico

  6. O edificio de engarrafamento

  7. O antigo cassino


Introdução

Conforme já narramos na Série Parque das Águas, foi o engenheiro Benjamin Jacob o responsável pela captação de nossas águas minerais (aqui).


 

Benjamin Jacob, no primeiro plano, examinando a captação das águas de Lambari


A captação das águas se deu em 1905, mas já antes dessa data Benjamin Jacob exercia o cargo de Engenheiro Fiscal das Aguas Mineraes do Estado, e foi nessa qualidade que produziu, em 1904, um relatório sobre o Parque das Águas de Águas Virtuosas, documento esse que foi apresentado pelo Secretario de Estado dos Negócios das Finanças, Dr. Antonio Carlos Ribeiro de Andrada, ao sr. Dr. Antônio Francisco de Salles,  então Governador de Minas Gerais.

Tal relatório, que vai abaixo reproduzido, conservando a ortografia daquela época, fornece uma descrição da precária situação do parque das águas e de nossas fontes, no início dos anos 1900.

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Acima pode-se ver o Parque das Águas e parte das edificações descritas no relatório abaixo, tais como: o antigo cassino (existente no interior do parque), o balneário, as fontes e o gradil de ferro que circundava o parque.


O RELATÓRIO DE BENJAMIN JACOB

SECÇÃO DE LAMBARY

Esta estancia está situada na Villa de Aguas Virtuosas, distante 6 kilometros da povoação de Lambary. A altitude acima do nivel do mar é de 900 metros.

As fontes

As fontes mineraes são em numero de quatro, sendo 2 gazosas e 2 férreo gazosas: uma destas ultimas, a fonte Maria ou Ferreira Netto, é considerada sulfurosa, porém nada justifica essa crença do povo.


Turistas, no Parque das Águas, em 1905


A fonte mais importante é a chamada do Parque: pertence ao grupo «las gazosas" e tem uma vasão do 48.000 litros em 24 horas.

Esta fonte cujos primeiros trabalhos de beneficiamento foram executados pelo engenheiro Gerber [1], vae ser agora captada em maio próximo por ordem do governo, dando assim cumprimento a clausula 6a. do contracto de 5 de outubro de 1900.  

 

A fonte do Parque é abrigada por um vasto chalet de madeira com duas paredes de venezianas, forrados de mozaico o solo e as paredes até uma certa altura; a bocca do poço que  tem 0,80 do diâmetro é também forrada de mozaico. Ha um empregado encarregado de apanhar agua para os aquáticos: para esse fim ele serve-se de um copo de prata suspenso a uma corrente do mesmo metal, de modo que as mãos não ficam em contacto com agua.

 

Ao lado dessa fonte fora do chalet que a protege, existe uma espécie de chafariz ao qual a agua da fonte do Parque devia chegar por meio de uma bomba aspirante. Segundo fui informado, semelhante combinação nunca deu resultado, provavelmente devido a grande quantidade de gaz carbónico que é também aspirada pela bomba.


Chalet que abrigava as fontes de águas minerais


A outra fonte gazosa acha-se em frente à precedente, abrigada por uma casinha de tijolo coberta de telhas chamada casa da bomba.

 

Ahi está installada uma bomba que leva a agua para o estabelecimento balneário: esta fonte não está captada e a sua agua é exclusivamente utilisada para usos externos; no logar existe um poço de 2,35 de altura ocupando a agua 73 centimetros no fundo.

As duas fontes ferreo-gazosas são conhecidas pelos nomes de Paulina e Maria ou Ferreira Netto; a primeira contém uma agua límpida, transparente, incolor, inodora, de sabor picante e ligeiramente estiptico; a agua da segunda é também limpida, transparente, incolor de sabor picante e levemente hepático de cheiro muito pouco pronunciado de acido sulphydrico; com o tempo deixa depositar flocos avermelhados de oxydo de ferro.

 

Cada uma destas fontes está abrigada per um elegante chalet octogonal com columnas de ferro fundido. Estão ambas mal captadas e situadas num pequeno jardim de 1.260 metros quadrados de superfície, fronteiro ao parque, cercado de gradil de ferro sobre sapata de alvenaria nos dous lados que dão para as ruas e de muro de tijolo, do 1, 50 m de altura nos outros lados: parte de um desses muros está ameaçando ruina. Este jardim está bem tratado, contendo flores em profusão, e pertence, ao Estado, em virtude da clausula 2ª. do contracto em vigor.


As fontes números 5 e 6, conhecidas por Fontes Paulina e Maria

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O Parque

O parque propriamente dito, de dimensões muito exiguas, apenas 5.500 metros quadrados, é cercado por três lados de ruas publicas e casas particulares; nelle estão as duas fontes gazosas, o estabelecimento hydro-therapico, e o cassino.

 

O seu cerco compõe se de gradil de ferro sobre sapata de alvenaria na maior parte do perimetro e de gradil de madeira sobre sapata, de alvenaria na parte restante. Existem cinco portões de entrada, 3 principaes e 2 de menor importância ; os portões principaes, de 2 metros de largura, estão collocados um ao lado do chalet da fonte do Parque, entre elle a casa da bomba: o segundo em frente ao primeiro e ao lado do cassino; o terceiro, em frente ao estabelecimento balneário.

 

Os dous outros portões abrem-se, um em frente ao chafariz da fonte do Parque, o outro em frente ao engarrafamento.


Vista do muro do parque, cercado de gradil de ferro, início dos anos 1900


O parque do Lambary foi convenientemente arborizado e ajardinado; mas hoje está muito mal conservado: as suas ruas muito estreitas, estão muito baixas, em nivel muito inferior ao das ruas que circumdam o parque, de modo que quando chove ficam alagadas, impedindo qualquer passeio dos aquáticos.

 

É necessário fazer -se um grande aterro no parque, numa altura de 0,50 m na media e ajardinal-o novamente.

No parque ha um caramanchão descoberto produzindo má impressão: seria melhor que fosse desmanchado.

A faixa do parque que liga os dous portões fronteiros e que é cimentada está muito gasta e cheia de buracos.

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O estabelecimento hidroterápico

O estabelecimento hydro-therapico é de construcção antiga; as suas paredes são de enchimento: mede 30 m de frente por 12 do fundo e tem na frente uma varanda cimentada de 3,90 de largura com grade de madeira: é simétrico em relação à sala de duchas que está no centro do edifício: consta de dous pavimentos: no inferior estão a sala hydrotherapica, salas de espera, gabinete do medico, escriptorio da gerência, vestiarios, banheiras e rouparias; no pavimento superior estão a sala de electretherapia, o observatório meteorológico e uma vasta sala que não é aproveitada: acima estão as duas caixas de agua gazosa, quente e fria para as duchas; essas caixas têm respectivamente uma capacidade de 3.500 e 5.800 litros.


Estabelecimento hidroterápico. Anos 1890. Reprodução. Fonte: ALMEIDA, 1896


A agua commum é elevada por uma bomba a vapor, sendo o motor aproveitado para accionar a machina eléctrica: por esse motivo é essa a unica machina electricca que funciona regularmente de todas as estancias de aguas do Estado, e a única que tem dado alguma renda; essa agua commum é canalizada e captada a cerca de 150 metros do distancia, em terrenos do Estado.

 

As banheiras são todas de 1ª. classe, feitas de ferro esmaltado; a sala de duchas é muito acanhada e os apparelhos não são completos: é commum a homens e senhoras. A sala de espera do lado dos homens está ocupada com a gerência.

O estado de conservação desse edificio é a peor possivel; muitas das paredes apresentam enormes rachas de lado a lado, indicando abatimento: o soalho está todo desnivellado; ha cerca de cinco anos o pavimento superior precisou ser sustentado por fortes columnas de madeira de lei: as paredes do banheiro n. 5 estão rachadas e completamente fora do prumo. O soalho e as paredes da sala de duchas estão muito estragados: foi preciso ultimamente fazer a substituição de parte dessa parede, que tinha ruido. Os encanamentos condutores de agua para o estabelecimento estavam muito estragados, mas foram substituídos por novos em fins do mez de fevereiro ultimo. 

 

Como ainda não me chegou às mãos o relatório desta secção, não posso indicar qual foi a renda do estabelecimento hydrotherapico durante o anno findo; devo, entretanto, declarar que examinando a escripturação fiquei agradavelmente impressionado com a renda da secção de electrotherapia, que foi de cerca de 1:000$000.

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O edifício do engarrafamento

O edifício do engarrafamento que pertence ao Estado em virtude da clausula 2ª. já citada, tem 28 metros de frente por 20,30 m de fundo; repousa sobre fundações de alvenaria e as suas paredes são de taboas collocadas verticalmente; é dividido em três partes sendo duas antigas e a terceira do lado ribeirão, recente; aquellas duas partes são assoalhadas, esta não o é. 

 

É coberto do zinco, o telhado é dividido em três aguas, sendo a do centro mais alta do que as lateraes. Ligando a fonte do parque ao edifício do engarrafamento, existe uma linha de bondes de 90 de bitola e 100 metros de extensão.


Vista do Parque das Águas. Primeira década de 1900


A lavagem das garrafas é feita no próprio edifício do engarrafamento em grandes tinas de madeira, sendo a agua para esse fim fornecida por uma caixa metallica circular, montada na parte central do edifício.

 

De accordo com a clausula 21ª. do contracto, a agua é esportada como sáe da fonte.

 

Durante o anno passado a exportação foi nulla.

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O antigo cassino

Existe nesta estancia de aguas um cassino, que é o antigo estabelecimento balneareo construído pelo engenheiro Gerber. Está collocado dentro do parque, atraz do actual estabelecimento hydrotherapico.



Actualmente está o cassino arrendado ao operoso sr. Affonso de Vilhena [2], que não tem poupado esforços para transformal-o em ponto preferido de reunião dos aquáticos. Este edifício está bem conservado, contrastando o seu aspecto com o do seu vizinho; tem sala de leitura, de musica, de bilhar e outros jogos, latrinas e buffet. Seria para desejar que todas as nossas estancias do aguas tivessem o seu cassino.

As observações meteorológicas foram muito incompletas, e os motivos são os mesmos apontados na secção de Cambuquira: alguns instrumentos desarranjaram se e foram remettidos para o Rio, para serem concertados e de lá não foram ainda devolvidos.

É medico e gerente da empresa nesta secção o sr. Dr. João Braulio Moinhos de Vilhena [3], o qual não tem cessado, conforme tive ensejo de verificar, de reclamar da directoria da empresa os meios necessarios para introduzir na estação de aguas sob sua administração os melhoramentos de que precisa.

 

Caxambu, 15 de Março de 1905.

Benjamin Jacob.— Engenheiro Fiscal das Aguas Mineraes. 

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Notas

[1] Henrique Gerber: foi o engenheiro que na década de 1860, mandado pelo Governo da Província, realizou obras de saneamento e urbanização para melhor aproveitamento de nossas águas minerais. Construiu também o Estabelecimento Balneário, que, inaugurado em 1872, foi demolido em 1922, quando do aumento do parque.

 

[2] Afonso de Vilhena Paiva: nascido em Campanha (MG) estabeleceu-se em Águas Virtuosas em 1890 como comerciante e desenvolveu aqui intensa atividade política, ao lado de João Bráulio Júnior, seu cunhado. Elegeu-se vereador por diversas legislaturas.

 

[3] João Bráulio de Moinhos Vilhena Júnior: médico e político de grande prestígio no Sul de Minas, nascido em Campanha (MG), em 23 de julho de 1.860, e que se estabeleceu em Lambari em 1890. Foi eleito deputado por diversas legislaturas. No Governo João Pinheiro ocupou o cargo de Secretário de Finanças de Minas Gerais. Faleceu em um acidente automobilistico em Paris, em 1908.


Fonte: Relatorio apresentado ao Exmº. Sr. Dr. Francisco Antonio de Salles, Presidente do Estado de Minas Geraes, pelo Secretario de Estado dos Negocios das Finanças, Dr. Antonio Carlos Ribeiro de Andrada.

 

Referências: ALMEIDA, Dr. Pires de. Lambary e Cambuquira - Hydro-estações ao Sul do Estado de Minas Gerais - Brazil. Typ. Leuzinger, Rio de Janeiro, 1896


Sobre o Parque das Águas, veja também: (aqui)


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Publicado por Guimaguinhas
em 06/04/2015 às 15h06

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