Ilustração: Painel histórico de Águas Virtuosas do Lambary, existente nos Supermercados BH em Lambari, MG
Como se sabe, em A LENDA DE ÁGUAS VIRTUOSAS narra-se que uma jovem de nome Cecília adoeceu e, tendo feito uso da água virtuosa, curou-se de seus males. Em agradecimento, pediu, então, ao pai que erguesse uma capelinha em homenagem à Nossa Senhora da Saúde.
O fundo mítico-religioso dessa estória: a fé na Virgem Santíssima e os poderes curativos milagrosos atribuídos às águas virtuosas – em cima do qual se construiu a lenda – veio naturalmente da tradição oral que surgiu nas primeiras décadas do Século XIX, logo após a descoberta das águas.
Com efeito, com a descoberta das fontes, as virtudes miraculosas da água medicinal [1] passaram a ser apregoadas por todos, e elas começaram a ser designadas, já a partir de 1801, por águas santas. [8] A expressão águas virtuosas começa a ser utilizada a partir de 1805, e acabou por nomear toda a região detrás da serra da Campanha por aquele nome: Águas Virtuosas. [8] E também a serra divisória entre Campanha e Lambari passou a ser conhecida, desde 1805, como Serra da Água Virtuosa ou Água Santa da Campanha. [1]
Desse modo, foi possivelmente a crença e a fé populares que associaram os efeitos medicinais e curadores da água aos milagres da Virgem Maria, como ficou assentado nos costumes devocionais católicos da Região das Águas Virtuosas. Aliás, a lenda bem apanhou esse aspecto: a cura de Cecília associa-se à devoção da Virgem Maria.
Segundo o monsenhor e historiador José Lefort [1], o criador da lenda teria sido Américo Werneck, que o fez para efeito de propaganda das águas minerais.
Mas há, também, derivadas daquela, as versões de Armindo Martins e João Carrozzo, memorialistas de Águas Virtuosas do Lambari.
É o que veremos a seguir.
Versão atribuída a Américo Werneck
O primeiro texto escrito da lenda sobre os poderes curativos das águas de Lambari , de que se tem notícia, apareceu em O Lambary, de 18/12/1910, cujo autor adotou o pseudônimo de Gratz.
Se considerarmos os aspectos relativos à data — 1910 — e ao estilo literário [2], essa é a possível versão escrita por Américo Werneck, num esforço de propaganda das águas minerais [1], quando veio a residir em Águas Virtuosas do Lambary e trabalhou com o Dr. Garção Stockler, criador da estância de Águas Virtuosas e primeiro grande propagandista das águas de Lambari. (aqui)
Esta versão pode ser examinada aqui
Veado pastando junto às sete quedas, 1910. Fonte: Museu Américo Werneck – Lambari, MG
Que dizes? Não é bella e fantastica a lenda de nossa infancia?
(AMÉRICO WERNECK. Graciema)
É de notar-se que numa passagem do romance Graciema (págs. 327/30), Werneck narra uma lenda, na qual vamos encontrar diversos elementos semelhantes à lenda de Águas Virtuosas, tais como: um casal apaixonado, mata virgem, cachoeira, um fato miraculoso e a aparição de Nossa Senhora.
De fato, ele narra que os personagens Juracy e Mário, que passeavam de barco por um rio cercado de matas, resolvem visitar uma cachoeira lá existente. E lá chegando, Juracy conta a Mário uma lenda acerca da infância de ambos: eles haviam sido achados, quando bebês, nesta cachoeira.
Continua Werneck narrando que, primeiramente, Mário foi encontrado por sua mãe, Hemergarda. Tempos depois, a mãe de Juracy, que não conseguia se engravidar, e orava muito a Nossa Senhora, teve um sonho. Nesse sonho aparece um anjo, que a conduz por longa e dificultosa caminhada numa noite fria, levando-a até essa mesma cachoeira.
E Werneck põe na boca da personagem Juracy as seguintes palavras:
Pois bem; já mamãi desconsolada se dipunha a regressar á sua vivenda, quando em cima d'aquelle penhasco appareceu a figura esbelta de Nossa Senhora. Uma lindeza, Mario. Um halo deslumbrante irradiava-lhe da cabeça. Seu manto azul, salpicado de estrellas, era feito de um retalho do céo. Olhou para minha mãi e disse: — "Ouvi tua prece. Para dar-te uma filha digna de tua fé, moldei-a nos idéaes mais limpidos do paraiso, e animei-a com o meu proprio sorriso. Dá-lhe o nome de Juracy, que significa estrella dos labios; ella despertará sempre a alegria em todos e será no mundo o emblema da pureza" .
(Mantida a grafia original do romance)
Reprodução. Ilustração do livro Graciema, p. 330.
O livro de Armindo Martins – Lambari, cidade das Águas Virtuosas – teve duas edições: 1949 e 1971. Nessa última edição, o texto sobre A Lenda de Águas Virtuosas aparece ligeiramente alterado em relação à 1ª. edição.
Abaixo reproduzimos ambas as versões:
Versão da 1a. edição, 1949, p. 25.
Versão da 2a. edição, 1971, págs. 17 e 18.
A versão de João Carrozzo, bastante elaborada, apareceu em 1964, na 1a. edição do seu livro Lambari (Outrora: Cidade de Águas Virtuosas da Campanha), que teve mais duas edições: 1977 e 1985.
Ela também foi reproduzida em 1988 neste seu outro livro: História cronológica de Lambari.
A versão abaixo foi retirada do livro Lambari, 3a. edição, páginas 35 a 40:
Baseados em Francisco Lefort [1], vejamos os fatos históricos, alguns deles apropriados e deformados pela lenda:
Fonte: Ruas de Lambari, MILEO, 1970, págs. 36-37