MEMÓRIAS DA INFÂNCIA - Aprendendo a nadar no Mumbuca
Ilustração: Cromo colorido baseado em foto de João Gomes D'Almeida. Pedra artificial da cascata do Lago Guanabara. na qual se pode ver antigo esguicho d'água, que imitava o dorso de uma baleia
Apresentação
O rio Mumbuca está na memória afetiva dos lambarienses, especialmente dos mais velhos, que o conheceram ainda livre da poluição que hoje compromete sua existência.
Aliás, sobre isso já escrevemos um post: (Adeus, Mumbuca?), e nele anotamos:
( ...) nesse Mumbuca de doída memória — brincávamos, pescávamos, nadávamos...
E então suas águas eram limpas, havia peixes... Todas as tardes, pescadores se postavam na ponte do Parque Hotel, em frente ao balneário do Imperial, na entrada e na saída do túnel do Hotel Imperial, na ponte do Parque Novo, em frente às duchas...
Hoje, vendo o Mumbuca tão degradado, cheio de lixo, malcheiroso, poluído, assoreado, me pergunto:
— Devemos dar adeus ao Mumbuca?
Chuvas que não vêm, fontes que secam, rios que morrem — e não é somente por obra da Natureza que isso vem ocorrendo. Em tudo isso, há, como sabemos, a pesada mão da imprevidência, do descaso e da irreponsabilidade do ser humano.
Assim, é certo que depende de nós — somente de nós — salvar o gracioso riozinho!
Hoje voltamos ao adorável riozinho para lembrar que foi nele que aprendi a nadar.
Vamos lá.
Mudando para a cidade
Nascido no bairro da Vila Nova e tendo passado pelo Pasto do Fubá, conto no livro Menino-Serelepe como se deu minha mudança para o centro da cidade:
Meu pai [conhecido por Dé da Farmácia] recebeu proposta de se mudar pra cidade, a fim de que pudesse atender o plantão noturno da Farmácia Santo Antônio, onde trabalhava. Por conta disso, teria um pequeno aumento no salário e passaria a morar em local próximo de seu trabalho, na parte de baixo da casa da dona Catarina Bacha, a sua patroa.
E nele me refiro, diversas vezes, a Evandro e Eunice, filhos de Dona Catarina Bacha:
(...) na casa de cima à nossa, morava a família da dona Catarina, viúva do seu Antônio Bacha: Edson, Ernani, Elisabeth, Eunice e Evandro, mais a Maria e a Carmelina, as empregadas domésticas.
................
Me liguei muito aos filhos da dona Catarina, principalmente à Eunice e ao Evandro, que regulavam comigo em idade.
Pois bem, uma boa diversão que eu e Evandro fizemos juntos foi aprender a nadar.
Foi assim...
Aprendendo a nadar
Lá pelos nossos 9 ou 10 anos, queríamos muito frequentar a piscina do Parque Novo (aqui), que, pelos idos de 1960, era um it * da cidade.
Mas como? — se não sabíamos nadar. Conversamos com minha mãe — que, cheia de cuidados com o filho o único, via perigo em tudo que eu fizesse, e ela disse não.
Falamos, então, com Dona Catarina, e essa encontrou a solução:
— Cês tem que aprender a nadar primeiro! Falem com o Dé, que ele resolve.
Foi assim que nas tardes de quinta-feira, dia de folga do meu pai, ele passou a nos levar na parte de baixo da barragem do Lago Guanabara para aprendermos a nadar.
A água era limpa, o volume maior e nós nadávamos nos poços que se formavam em torno da pedra, e de cima dela davámos pontas e cambalhotas nos locais mais fundos e mergulhávamos sem sustos...
E fomos exercitando e aprendendo, até que, cheios de marra e garbo, pudemos frequentar a nossa piscina do Parque Novo.
[*] It = Expressão ou gíria dos 1960/70, significando uma pessoa, coisa ou atividade diferenciada, charmosa.
Piscina do Parque Novo
Nadar na barragem — coisa impensável nos dias de hoje
Anos atrás, as duchas eram concorridas, e podia-se ainda nadar na pedra da barragem.
Duchas, barragem e Rio Mumbuca cheios de gente
Atualmente, é assustadora a imagem do rio Mumbuca passando pela barragem do Lago Guanabra: lixo, mato, lodo, mau cheiro.
Em algum tempo, gerações futuras voltarão a nadar ali?
- Menino-Serelepe - Um antigo menino levado contando vantagem. Antônio Lobo Guimarães. Belo Horizonte, edição do autor, 2009
- Museu Américo Werneck
- Arquivo pessoal do autor
O livro Menino-Serelepe
O livro Menino-Serelepe - Um antigo menino levado contando vantagem é uma ficção baseada em fatos reais da vida do autor, numa cidadezinha do interior de Minas Gerais, nos anos 1960.
O livro é de autoria de Antônio Lobo Guimarães, pseudônimo com que Antônio Carlos Guimarães (Guima, de Aguinhas) assina a série MEMÓRIAS DE AGUINHAS. Veja acima o tópico Livros à Venda.