Ilustração: Capa do livro Ruas de Lambari, de José Nicolau Mileo
Nesta Série Ruas de Lambari, tomando por base o livro de J. Nicolau Mileo mencionado acima, vamos (re)ver os principais logradouros públicos de Águas Virtuosas de Lambari e bem assim as figuras humanas ou fatos e acontecimentos que reverenciam.
No prefácio de seu livro, editado em 1970, José Nicolau Mileo anotou:
É esse, pois, o espírito desta série.
Vamos lá.
Abaixo vão nomes de ruas e logradouros públicos da Vila de Águas Virtuosas de Campanha (depois: Lambary), dos anos 1834 a 1880. Eram nomes pitorescos e bucólicos, tais como: Formosa, Solitária, Largo da Capela, Pito Aceso, Atrás do Morro, da Cava, da Vargem.
Confira:
Mudanças de nomes
Fonte: Subsídios para a história de Lambari. José Nicolau Mileo, pag. 126 |
Em 1902, mediante a Lei n. 7, de 26 de abril de 1902, na gestão de Eustáquio Garção Stockler, então agente executivo de Águas Virtuosas, foram dados nomes a ruas, praças e travessas da vila.
Confira:
Remodelação e embelezamento da cidade
Em 1909, Américo Werneck assumiu a prefeitura de Águas Virtuosas de Lambary e a presidência da Comissão de Melhoramentos e a superintendência das obras de embelezamento da cidade, visando a redomelar e embelezar Águas Virtuosas. Para isso, adquiriu cerca de 100 terrenos e prédios, fosse para dotar a cidade de novas ruas e avenidas, fosse para construção de prédios e edificações que idealizara (cassino, lago, hotel, teatro, etc.). Nessa quadra da nossa história, deu-se a criação de ruas, calçamento, demolição de prédios antigos, retificação do Rio Mumbuca, entre outras obras (Plano geral das obras de Américo Werneck - aqui).
Note-se que parte dessas obras realizadas por Werneck já constavam de plano anterior, traçado por João Bráulio Júnior [1] e aprovado por Garção Stockler, quando esse último exerceu o cargo de agente executivo municipal (plano de saneamento e embelezamento da vargem e alinhamento das principais vias de acesso ao Parque das Águas).
Mapa das ruas centrais de Águas Virtuosas. Fonte: Armindo Martins
Vista aérea do centro - Anos 1940 - Fonte: Armindo Martins
Vista aérea de Lambari - Anos 1950
Metrópoles europeias inspiraram Américo Werneck
A urbanização e as obras fundadoras de Águas Virtuosas de Lambary, executadas por Américo Werneck, como já escrevemos aqui, foram inspiradas nos princípios de remodelação difundidos pelas metrópoles europeias, exemplificadas, principalmente, no projeto urbanístico do Barão Haussman de modernização da medieval Paris, e assim também na experiência que ele tivera na construção de Belo Horizonte (1894-1914), conforme anota o historiador lambariense Francislei Lima da Silva [2].
Recorde-se que por essa época da construção da nova capital mineira, Werneck exercera funções de Secretário de Agricultura no Governo Silviano Brandão (1898-1902), fora prefeito de Belo Horizonte por pequeno período (setembro de 1898) e fizera parte da Comissão Construtora da Nova Capital (29 de dezembro de 1897 a 14 de abril de 1899) [aqui].
Nessa perspectiva, Francislei Lima da Silva, no trecho supracitado, escreve que
Nos planos idealizados por Américo Werneck (1909) para a cidade de Lambari, podem ser percebidos tais princípios que objetivam uma nova civilização. Um grande jardim central demarca a ordenação dos espaços e da vida dos cidadãos, dele partindo todos os boulevards que por sua vez delimitam as zonas destinadas aos prédios públicos, ao comércio e às moradias, sendo o cemitério construído fora do perímetro urbano. As largas avenidas arborizadas na outra extremidade serão encerradas por pequenos jardins e parques, lugar de recreio. A cidade, enfim, será organizada a partir dos cinturões verdes.
Os planos urbanísticos se referem a uma melhor adequação dessas áreas aos parques do que aos jardins. A estância balneária de Lambary será disposta de forma que todas as principais avenidas levem até o seu complexo balneário, dispondo ao redor do centro urbano seus parques, reservas florestais e áreas de lazer. Formando-se, assim, um grande cinturão verde, que convidava seus habitantes e visitantes a desfrutarem de hábitos ditos saudáveis e civilizados.
Como é natural, fatos e acontecimentos históricos e políticos suscitam mudanças de nomes e logradouros públicos, às vezes com prejuízo da memória das cidades.
Por aqui, podemos citar algumas mudanças na área central da cidade, tais como:
Vista da antiga Rua Silviano Brandão, atual Rua Dr. José dos Santos
Algumas ruas e/ou personalidades ligadas à história de Águas Virtuosas de Lambari já foram objeto de posts aqui no GUIMAGUINHAS.
Confira:
Índice da Série Ruas de Lambari
[1] MILEO, José Nicolau. Ruas de Lambari. Guaratinguetá, SP : Graficávilla, 1a. edição, 1970, pág. 20.
[1] LIMA DA SILVA, Francislei. OS MONUMENTOS DA ÁGUA NO BRASIL - Pavilhões, fontes e chafarizes nas estâncias sul mineiras (1880-1925) [Dissertação de Mestrado - UFJF - 2011] - Disponível em: http://www.ufjf.br/ppghistoria/files/2011/01/Francislei-Lima-da-Silva.pdf - págs. 62/63.
Fontes de citações e reproduções
(*) Citações parciais para estudo, de acordo com o artigo 46, item III, da Lei de Direitos Autorais (Lei nº 9.610 de 19 de Fevereiro de 1998)
Ilustração: Recorte da fachada lateral do casarão de Benício Chaves, na rua que levou o seu nome
As cidades crescem e evoluem, e nessa marcha antigas edificações desaparecem para dar lugar a novos empreendimentos imobiliários. Com a demolição, no entanto, vão embora marcas culturais e históricas e parte importante da memória das cidades.
Claro, não se pode travar o progresso urbano, mas deve-se pensar em meios de pôr a salvo certos lugares memoráveis das cidades. Com a preservação de antigos imóveis, guardam-se em imagens vivas não somente técnicas de construção e arquitetura ou recursos materiais e de engenharia, e sim também significados históricos e memórias de acontecimentos e pessoas, pois, como dizia o poeta Góngora:
Não existe rua com pedras mudas nem casa sem eco.
Nesta série Antigos casarões de Águas Virtuosas vamos registrar breve memória de algumas edificações centenárias e outras quase centenárias de nossa cidade, que ainda resistem ao império do tempo e da evolução urbanística.
Vamos lá.
Benício Chaves, médico paraense formado pela Faculdade de Medicina da Bahia, por mais de 30 anos clinicou em Lambari, nas primeiras décadas dos anos 1900.
Estudioso da crenoterapia [tratamento com águas minerais], escreveu um livro sobre as propriedades curativas de nossas águas. Coube a ele também, no início dos anos 1900, lançar a campanha para a captação e separação das fontes das águas de Lambary.
O Hospital e Asilo São Vicente de Paulo foi fundado por sua iniciativa, tendo sido também Benício Chaves quem orientou a construção e presidiu a comissão encarregada da edificação dessa instituição, que há um século serve à comunidade lambariense.
Benício Chaves faleceu no Rio de Janeiro, em 1943.
Dr. Benício Chaves passeia com a amiga Zulmira Silvestrini, no centro da cidade do Rio de Janeiro, anos 1930.
Confira o post Dr. Benício Chaves, estudioso das Águas de Lambari e fundador do seu Hospital - aqui
Pois bem, graças à dica feita ao GUIMAGUINHAS pela professora Karla Gentil, escolhemos o casarão centenário que pertenceu ao dr. Benício Chaves para abrir esta série.
Abandonada e fechada há anos, mas com sua fachada e linhas ainda preservadas, a bela propriedade se encontra à venda. Mas parte de sua histórica vamos contar aqui.
Em frente, pois.
Antiga vista da atual rua Francisco de Biaso, na qual se pode ver, ao fundo e do lado direito, a fachada do casarão que pertenceu a Benício Chaves
Na belissima fachada, que ainda preserva as linhas e os materiais seculares, pode-se ver a placa de Vende-se
Vista da fachada, passeio e ruas - mais de 100 anos de história de Águas Virtuosas
Vista das fachadas lateral e frontal do casarão
Os imponentes janelões fronteiros
A fachada lateral, que dá para a rua Benício Chaves
O mais antigo casarão de Águas Virtuosas
Este imponente casarão, que fica na parte alta da Rua do Parque, será objeto do próximo número desta série.
Pelo que sabemos, trata-se do mais antigo casarão de nossa cidade, erguido em meados do Século XIX.
Aguarde.
Ilustração: O velho sobrado, na grande curva do Lago Guanabara, em Lambari, MG, e que foi demolido (Fonte: GoogleMaps)
Conforme está no número 1 desta série, nosso objetivo é recordar antigas vivendas e casas de veraneio na Volta do Lago, um dos recantos mais belos de nossa cidade.
O referido post número 1 foi dedicado ao RETIRO DO LAGO de Gustavo Barroso (aqui)
No número 2, falamos da vivenda OLHO D'ÁGUA, que pertenceu à museóloga e professora Nair de Moraes Carvalho (aqui)
E no número 3, da vivenda intitulada CASA DOS ARTISTAS (aqui).
E neste número 4, vamos focalizar o velho sobrado, que ficava próximo da grande curva do lago.
Vamos lá.
Muitos se recordam do sobrado abaixo, que se projetava imponente na Volta do Lago.
Por muitos anos sem moradores, o velho sobrado foi aos poucos se acabando, e em 2017 foi vendido e logo depois demolido.
O terreno vazio, após a demolição
Atualmente, o local tem o seguinte aspecto:
É o ritmo natural das coisas — as velhas edificações vão cedendo espaço a construções modernas. De qualquer sorte, é doído ver o prejuízo que isso traz aos pósteros e à memória urbanística das cidades...
Esta série sobre as antigas vivendas da Volta do Lago trata-se apenas um modesto registro para a memória das gerações futuras.
Veja o que comentamos sobre a Rua dos Italianos:
Gerações de lambarienses passam por esta rua sem conhecer sua importância na história de nossa cidade, surdas ao vozerio de suas pedras centenárias, indiferentes aos ecos de suas antigas casas...
Ilustração: Recorte da Casa dos artistas, na Volta do Lago, em Lambari, MG
Apresentação
Conforme dissemos no número 1 desta série, dedicado ao RETIRO DO LAGO de Gustavo Barroso aqui, nosso objetivo é recordar antigas vivendas e casas de veraneio na Volta do Lago, um dos recantos mais belos de nossa cidade. Assim, também já falamos da vivenda OLHO D'ÁGUA, que pertenceu à museóloga e professora Nair de Moraes Carvalho, colega de trabalho de Gustavo Barroso no Museu Histórico Nacional (MHN) por longos anos (aqui).
Pois bem, hoje vamos falar da vivenda intitulada CASA DOS ARTISTAS.
Vamos lá.
Segundo conta Bibianinho Carvalho1, um dos últimos memorialistas de Lambari, a vivenda hoje conhecida por CASA DOS ARTISTAS foi construída nos anos 1940 por um português de nome Boaventura, um funcionário da embaixada de Portugal, radicado no Rio de Janeiro, que frequentava a estância de Águas Virtuosas de Lambary. Boaventura acertara um grande prêmio de loteria e resolveu construir aquela bela casa na Volta do Lago.
Anos mais tarde, a tal vivenda foi adquirida pelo casal Paulo Gonçalves e Teresinha Moreira — atores e dubladores — que por várias temporadas frequentaram Lambari. E em suas vindas, traziam muitos convidados, artistas como eles, advindo daí o nome: CASA DOS ARTISTAS.
(Na casa de Lambari) ... eu vou pescar, passear de barco, fazer tudo que há muito tenho vontade e não consigo curtir, por absoluta falta de tempo, devido a compromissos profissionais
PAULO GONÇALVES
Atores e dubladores, Paulo Gonçalves e Teresinha passaram pelo rádio, cinema, teatro e televisão com grande sucesso, com tipos marcantes e ainda hoje reconhecidos do público.
De fato, novelas como O bofe, Cavalo de aço e Bandeira 2, ainda estão na memória afetiva de quem passou pelos anos 1970-80; em todas elas Paulo Gonçalves atuou. Como dublador, sua voz está em personagens como Zorro e Homem de Ferro, entre muitos outros.
Teresinha também passou pelas novelas (ela atuou em O Cafona, por exemplo) e por programas humorísticos (Faça amor não faça a guerra). Como dubladora fez a inesquecível Olívia Palito, do desenho Popeye.
Revista Amiga, n. 142, de 06/02/1973 - bn.digital.gov.br (Reprodução)
Fonte: Casa da dublagem
No site Casa da Dublagem (aqui), que disponibiliza uma memória riquíssima dessa arte no Brasil, encontramos os seguintes registros sobre Paulo Gonçalves e Teresinha Moreira, e bem assim áudios por eles produzidos. Confira:
Youtube - Desenho Popeye e Olivia Palito (esta dublada por Teresinha Moreira)
No início dos anos 1990, defronte a casa foi construída uma pracinha — a Praça dos Artistas — que se tornou um agradável ponto turístico em face da casa famosa, da vista do Lago Guanabara e do conhecido bougainville*, tido como o maior do mundo na espécie.
Fonte: Joseane Astério - reprodução
Vista atual da Casa dos Artistas
Em 2016, a casa começou a ser reformada - Reprodução - Google Maps
Na página do Facebook do site GUIMAGUINHAS (https://www.facebook.com/historiasdeaguinhas/), foi grande a repercussão deste post, com muitos comentários e compartilhamentos, inclusive novas informações sobre a história da CASA DOS ARTISTAS.
Confira:
Ilustração: Capa do livro Cinza do tempo, de Gustavo Barroso, com contos versando sobre histórias e pessoas de Águas Virtuosas de Lambari
Como já dissemos aqui, aqui, aqui e aqui, o jornalista, escritor e ensaísta Gustavo Barroso [Fortaleza, CE, 29/12/1888. Rio de Janeiro, RJ, 3/12/1959] foi diretor do Museu Histórico Nacional, por mais de 30 anos e membro da Academia Brasileira de Letras.
Barroso era apaixonado por Águas Virtuosas de Lambary, e aqui construiu o Retiro do Lago, a sua vivenda postada na beira do Lago Guanabara, que frequentou por anos e anos. Em razão disso, trazia amigos para conhecerem a estância e fez muitos outros em Lambari, e sobre esse período escreveu diversos textos, especialmente crônicas e contos.
Pois bem, alguns desses contos foram reunidos no livro Cinza do tempo, que comentamos a seguir.
Confira.
Dos 29 contos reunidos em Cinza do tempo, de 1952, treze deles fazem referências a Águas Virtuosas: pessoas, lugares, histórias.
De fato, lá estão menções ao Mericão (alugador de Cavalos), a Chico Peão (Francisco Costa Prado), às crianças voltando da escola, aos caboclos a cavalo, às tropas de burros vindo da Capelinha do Imbirizal, de Jesuânia, de Olímpio Noronha, de Silvestre Ferraz; ao Lago Guanabara, à Volta da Mata, à estrada para o Pinhão Roxo e Vila dos Coqueiros (atual Heliodora), à antiga fábrica de garrafas, às paineiras, fronteiras ao seu Retiro do Lago, aos caniços, patos selvagens e jaçanãs no entorno do lago.
Índice de Cinza do tempo, de Gustavo Barroso
A maioria dos contos acima fazem referências a pessoas, lugares e histórias de Águas Virtuosas de Lambari
Reprodução. Revista O Cruzeiro
A equitação era o esporte preferido de Gustavo Barroso, e seus cavalos —entre eles os puros-sangues Honey e Juriti — eram cuidados por Chico Peão, numa cavalariça existente ao lado da propriedade de Barroso, na Volta do Lago.
Chico Peão e Barroso eram amigos, cavalgavam juntos e contavam-se muitas histórias. Entre elas, coletadas no livro acima, está a que foi narrada em O burro preto.
Confira:
O Burro Preto, extraído de Cinza do tempo, de Gustavo Barroso (Editora A Noite, RJ, 1952)
Seu Chico Peão, personagem do conto O burro preto