Ao médico e amigo José Benedito Rodrigues sempre fui muito agradecido em razão de fatos marcantes, alguns já narrados no Menino-Serelepe, como estes:
- Ele fez o meu parto e me medicou em criança (págs. 25 e 32);
- Ele ofereceu a meu pai e ao tio João, em certa época, um cômodo, ao lado de sua casa, e o incentivo para que abrissem uma farmácia - o que acabou não ocorrendo, em razão do receio que esses dois tinham de se arriscar no comércio (pág. 47).
Foi o doutor José que no final dos anos 1970 me relatou, tão emocionado quanto eu, a doença fatal que levaria meu pai. Ele disse: Nosso Dé tem uns três meses de vida! Foi também ele - mais dr. Ismael e dr. Wander - que o operaram, em Lambari, pois meu pai não queria ser atendido fora e por médicos desconhecidos... O estádio avançado da doença não lhe deu muitas chances, mas a intervenção cirúrgica aliviou seus sofrimentos e concedeu-lhe alguns meses a mais de vida.
E durante esse tempo ele visitava meu pai quase que diariamente. E nunca lhe cobrou uma consulta! E assim também o fizeram dr. Ismael e dr. Wander, que muito estimavam meu pai.
Fui também, ainda jovem, no começo de minha carreira profissional de contabilista, responsável técnico por sua declaração de imposto de renda e, depois, de uma empresa que abriu em sociedade. Mais tarde, tive a oportunidade de orientá-lo sobre questões legais quanto à isenção do IR Pessoa Física de sua aposentadoria, em face de uma delicada cirurgia de coração a que se submetera.
Mas houve entre nós também alguns episódios "literários", vamos dizer assim. Dele possuo com fraternas dedicatórias O retrato do velho médico (1993) e Casa Progresso (1999). Algumas vezes, o visitei em sua rica e variada biblioteca, e ele me mostrou diversos livros autografados que possuía: Gustavo Barroso, Ivan Lins, Basílio de Magalhães; e também as inúmeras biografias que colecionava; e os livros de Albert Schweitzer, médico e autor que admirava; e ainda as notas e as páginas datilogradas das memórias que viria a publicar. Tantas vezes, tarde da noite, madrugadas a dentro, podiam-se ver acesas as luzes de sua biblioteca para o expediente da literatura...
Já estava bem doente quando me telefonou para dizer que estava adorando Abigail [Mediunidade e redenção], que eu lhe dera de presente. Ele disse ao telefone: Já li quarenta páginas de uma sentada! E olha que não estou podendo ler tanto! Mas o livro está fácil de ser lido...
Seus livros(1)- memórias e casos de sua longa vida dedicada à medicina - ainda podem ser encontrados, e valem a pena ser lidos. Boas e divertidas histórias, ricos casos da medicina da cidade, episódios literários e sociais de Lambari e Jesuânia. Um registro histórico importante para a memória dessas cidades.
Não era lambariense, mas jesuanense, e sua cidade conferiu justamente à Unidade Básica de Saúde da cidade o nome do filho ilustre. (2)
(1) O retrato do velho médico - Belo Horizonte : Cutiara, 1993; Casa Progresso - Belo Horizonte : O Lutador, 1999; Pescados no rio da memória - Belo Horizonte : O Lutador, 2005.
Macchado Sobrinho é poeta desde que eu o conheço, e lá já se vão mais de quarenta anos. Bem, isso é só uma brincadeira, pois ele deve ter nascido poeta, visto que a poesia vive a cintilar em seus olhos, a agitar-se em sua língua, a tremular nos seus dedos, a desprender-se de sua pena nervosa, inspirada, fluente.
Ele é poeta todo o tempo. Transpira poesia. Lê poesia. Vive poesia. Escreve poesia a cada dia, a cada hora. Foi ele quem primeiro leu minha prosa incipiente, lá pelos meus vinte anos e corrigiu meus erros e me incentivou a que continuasse. E tem para comigo um gesto de extrema delicadeza e amizade: a cada 14 de novembro me presenteia com um soneto!
O poeta, no entanto, só estreou em livro em 2009, com o seu Os Prós & Os Contras. Dessa obra, diz Marcus Vinícius de Negreiros, prefaciando o livro:
Uma das grandes questões da literatura é saber o escritor como conciliar emoção e forma, como fundir numa obra literária a variada gama de sentimentos, sensações, concepções, princípios, que, juntos, vão formar o sujeito, sem perder a beleza do fazer poético quando transportado para o papel. É justamente aí que reside a força deste livro de Macchado Sobrinho. Ao ler os seus poemas, parece-nos ouvir o grito que sai das entranhas, podemos sentir o seu lamento mudo, sua indignação. Suas vísceras estão expostas. [..............................]
A busca pelo vocábulo perfeito, seja num soneto, seja num hai kai, permeia toda a obra do autor. Dono de um vocabulário vastíssimo, e a despeito de nos enviar algum vez ao dicionário, escreve de maneira simples, com linguagem coloquial.
Esse vocabulário a que se refere o prefaciador é fruto de toda uma vida de leituras e anotações. Vastas leituras de poesias e literaturas tantas. Outras línguas aprendeu Machaddo no silêncio e no anonimato do autodidatismo, mas domina tão bem o francês, por exemplo, que traduziu, a convite de Alcino Leite Neto (este também um lambariense), para a revista Trópico (de 9/jul/2003), quatro poemas do Diário de viagem de Blaise Cendrars - o famoso poeta suíço que escrevia em francês.
Os poemas traduzidos foram estes: Águas de Portugal, A bordo do Formosa, Gorée e Bubus. Abaixo um deles traduzido:
ÁGUAS DE PORTUGAL
Sur les Côtes du Portugal
Do Havre optamos por seguir a rota dos antigos navegantes
Espaçosamente o mar de Portugal é coberto de barcos e pesqueiros
É de um azul contínuo e de pelágica transparência
O tempo é claro e quente
Estala o sol de cheio
Inumeráveis algas verdes microscópicas vêm à tona
Produzem alimentos que lhes facilitam uma imediata proliferação
São inexaurível sustento para a legião de infusórios e as delicadas larvas marinhas
Animais de toda espécie
Vermes estrelas e ouriços-do-mar
Crustáceos miúdos
Mundinho efervescente à superfície das águas de escancarada claridade
Gulosos e esganados
Chegam os arenques as sardinhas as cavalas
Atrás deles tainhas atuns bonitos
A que sucedem os cações marsuínos e delfins
O tempo é claro a pesca propícia
Quando o tempo se nubla os pescadores ficam mal-humorados e fazem chegar seu protesto até a tribuna do parlamento
De Os Prós & Os Contras escolhi o que segue, poema que tempos atrás pus como inspiração na abertura de uma página eletrônica de redação e língua portuguesa. Ei-lo:
O Náufrago
Se você quiser escrever, escreva:
na roupa no muro no chão na lousa!
Escreva o que quiser, o que não deva;
escreva uma palavrão, ou qualquer coisa.
De cabeça para baixo, ouse, atreva!
Girafa violino mariposa!
Pobre do artista, aquele que não ousa,
e leva a vida como a vida o leva...
O trevo o turvo o travo a trave a treva.
Vá escrevendo sem metro, rima ou arte,
sem preconceito qualquer sem reserva!
Escreva com o sangue que está na veia;
infeste o mundo, espalhe a toda a parte...
Só não espere, não, que alguém o leia.
O seu livro pode ser encontrado neste site: www.livrorapido.com
O Segredo do Águas Virtuosas Futebol Clube é um livro do lambariense Luiz Oswaldo Carneiro Rodrigues (LOR), que também o ilustrou. O autor estudou medicina esportiva e procurou aprender a fazer pesquisa durante o seu doutorado em fisiologia do exercício. Assim, domina bem os ingredientes da história que conta, ou seja, a medicina aplicada ao futebol, e, como filho da terra, fatos e histórias do glorioso time do Águas Virtuosas.
O segredo do livro — diz Angelo Machado — é boa literatura e boa divulgação científica, na medida em que o complexo problema da termorregulação nos atletas é tratado de maneira simples e bem-humorada. O leitor aprende sem saber que está aprendendo.
O autor e dois de seus personagens
Além disso, Luiz Oswaldo conseguiu - ao lado da redação agradável e das ótimas ilustrações - juntar temas e personagens de Aguinhas: o time de futebol, alguns de seus atletas, como Ricardinho, e outros parentes e amigos do LOR. Esse modelo - o de cantar sua própria aldeia, como dizem os russos - é universal, mas certamente fala bem de perto com o leitor lambariense, que logo se vê nas coisas e nas pessoas de sua terra.
O livro saiu pela Editora LÊ e pode ser visto neste link: Estante Virtual
Ilustração: Logo do Museu Américo Werneck (MAW) - Lambari, MG
O Museu Américo Werneck (MAW), que justamente homenageia o primeiro prefeito, o arquiteto e empreendedor das grandes obras da cidade (lago, cassino, farol, etc.), foi fundado em dezembro de 1997 por iniciativa do lambariense NASCIME BACHA, conforme está registrado no Cartório do 2o. Ofício de Lambari (Livro A2 - folha 50).
O MAW já funcionou nas dependências do Cassino de Lambari. Como esse prédio foi se deteriorando ao longo dos anos e não oferecia segurança, o acervo do museu ficou tempos sob a guarda do sr. Nascime Bacha, antigo e denodado coletor e defensor da memória da cidade. Ele manteve encaixotada, em sua própria residência, boa parte do acervo.
Atualmente, o MAW aguarda a reforma da antiga Estação Férrea de Nova Baden para lá se alojar.
Parte de sua reserva técnica está instalada no Parque das Águas.
NASCIME BACHA - FUNDADOR DO MUSEU AMÉRICO WERNECK
Reprodução. Facebook Prefeitura de Lambari - 10/09/2015
https://www.facebook.com/search/top?q=nascime%20bacha
Havia notícias de uma reforma do Cassino e informações de que, após essas obras, o acervo do museu retornaria ao prédio centenário. Mas até hoje (janeiro de 2024) isso não ocorreu.
(2) Veja, no link abaixo, reportagem publicada pelo Estado de Minas:
A patronesse do Museu Américo Werneck é a lambariense Alaíde Lisboa de Oliveira, autora do famoso livro infantil A Bonequinha Preta.
Reportagem publicada em 2009 pelo jornal Estado de Minas(2), tratando das condições do Museu Américo Werneck e de duas filhas ilustres de Lambari - as irmãs escritoras Henriqueta e Alaíde Lisboa, registra que:
Henriqueta Lisboa nasceu em Lambari em 15 de julho de 1901 e a irmã Alaíde, no dia 22 de abril de 1904. Eram filhas do farmacêutico e deputado federal João de Almeida Lisboa e Maria de Vilhena Lisboa, que tiveram 14 filhos. Elas estudaram no Grupo Escolar de Lambari e no Colégio Nossa Senhora de Sion, na vizinha Campanha, antes de a família se transferir para o Rio, em 1926.
Henriqueta estreou na poesia com o livro Fogo fátuo, em 1925. Em 1935, ela se mudou para Belo Horizonte, onde atuou como poeta, tradutora, ensaísta e professora. Publicou 17 livros e mais quatro volumes com seleção de sua poesia. Morreu em 9 de outubro de 1985.
Alaíde publicou cerca de 30 livros entre ensaios de educação, didáticos e literários. Foi professora em Lambari, no Instituto de Educação de Minas Gerais e na Universidade Federal de Minas Gerais. Foi colaboradora do Estado de Minas. É autora do clássico A Bonequinha Preta, que teve sucessivas edições desde 1938 e de O Bonequinho Doce. Foi a primeira mulher a assumir uma cadeira de vereadora em Minas Gerais. Casou-se com José Lourenço de Oliveira e teve quatro filhos. Faleceu em 6 de novembro de 2006, aos 102 anos.
VEJA TAMBÉM: Literatura de Aguinhas (5) - Uma família de escritores e poetas
Depois de longa espera, em 2020, a Câmara Municipal de Lambari, por iniciativa da vereadora Yara Vilhena, aprovou a instalação do Museu Américo Werneck.
O MAW deverá ser instalado na antiga Estação Férrea de Nova Baden, que para isso passará por reformas e adaptações.
Antiga Estação Férrea de Nova Baden, onde se pretende instalar a sede do Museu
Atualmente, parte do acervo do MAW está alojada no Parque das Águas.
Instalação da Reserva Técnica do Museu, no Parque das Águas de Lambari
Sobre o Museu Américo Werneck e/ou Nascime Bacha, veja também
Sobre Américo Werneck, veja a Série Américo Werneck - aqui
Em dezembro de 2022, visitei o MAW (Parque das Águas) para fazer entrega do seguinte:
MUSEU AMÉRICO WERNECK - Planta de Águas Virtuosas ao tempo de Werneck (1909)
Quatro décadas em fotos
Esta foto é cópia de uma que me foi emprestada por Sebastião Pinto, em cujo verso está escrito: Time do Águas Virtuosas de 1930 - Lembrança de Antônio Rossatt.
Na foto, provavelmente estão alguns destes craques da década de 1930: José Pinto, Eduardo, Olímpio, Braz, Nico, Matias, Amâncio, Azarias, Artur Paiva, Ditão, Canário, Jacaré, Pelota, Guardião, Rossatt
O ÁGUAS VIRTUOSAS, 20, set, 1953 - Victório Giacóia
Time do Vasquinho, em 1961, que disputava campeonato amador regional.
Em pé: José Roberto (árbitro), Jaime, Chanchinha, [?], Motinha, José Carlos, Guinho e Gidão. Agachados: Gil, Walmando, Chá, Zezé e Betinho.
Time do Águas amador,1962.
Em pé: Geraldo, Chá, Cabritinho, Tinz, Delém, Zé Carlos e Jaú. Agachados: Serginho Barletta, Betinho, Valmando, Zoinho e Chiquinho Barletta.
Time semiprofissional do AVFC, 1968, que disputaria a segunda divisão para acesso à primeira.
Em pé: Wílson, Bulau, Pulga, [?], Liu e Motinha. Agachados: Sérgio, Valmando, [?], Betinho e Miltinho.
Time do Águas, campeonato amador da Liga de Caxambu em 1975.
Em pé: Tucci, Hélio Costa, Sérgio, Leonardo, Tinz e Chicão. Agachados: Décio, [dois jovens do juvenil do Guarani de Campinas], Guima e Tonho.
Time do Águas, campeão da Liga de São Lourenço, nos anos 1980.
Em pé, entre eles: Chá, Heitor, Márcio, Pedro, Manezinho, Chiquinho, Quati, Zé Luiz e Expedito. Agachados: Luizinho, Flavinho, Zé Mauri, João, Gabriel, Sansão.