Ilustração: Guima e Celeste, em Brasília, solenidade de formatura do filho Carlo Emílio Guimarães e da (futura) nora Viviane Couto Cocco
Por quase toda sua vida, minha tia Irene Guimarães (depois do casamento com tio Darci: Pereira Guimarães) morou com meus avós Zé Batista e Margarida.
Pois bem, desde menino frequentei muito o casarão, defronte do Hotel Imperial, onde moravam.
À esquerda da foto, o casarão, do qual meus avós ocupavam a metade
Margarida e Zé Batista
O sobradão do Pai Véio e os trolinhos de cabos de vassoura
Aqui: https://guimaguinhas.prosaeverso.net/blog.php?idb=37406#casarao
E naqueles tempos — da meninice até meus 18 anos — compartilhei com minha tia a queda por músicas românticas e boleros — e com meu avô o gosto pela modas e poesias caipiras.
Regina da D. Zuza e tia Irene, cozinhando e cantando...
Assim foi que arranjei um velho caderno de capa azul, cujas folhas usadas arranquei, e nele transcrevia poesias e letras de música, que declamava ou cantava em parceria com os dois...
Imagem ilustrativa do caderno que ficava na sala da casa de meus avós, atrás de um velho rádio... (Fonte: CoPilot)
No caderno de capa azul estavam as letras de Cabocla Tereza, Folha Seca, Luar do Sertão, A flor do maracujá, Casa de Paia, Futebol da Bicharada, Asa Branca; versos de Castro Alves, Catullo da Paixão Cearense, Cornélio Pires — e letras de boleros (versões): O Relógio, A História de um Amor, Quizás, Sabor a mi, etc. — e também de músicas românticas: sucessos de Agnaldo Rayol, Altemar Dutra, Ângela Maria, Nora Ney, Nelson Gonçalves, Dolores Duran, Cauby...
Pois bem, com meus 14/15 anos, me lembro bem, as mulheres — minha avó, minha tia, minha mãe — na sala vendo novelas na TV Tupi e eu na cozinha embalando o sono dos primos: ora de Marcelino, ora de Darcirene — e cantarolando [*] boleros...
E continuei "cantando" boleros que minha tia me ensinara por toda minha vida...
[*] Cantar baixo, fora do tom ou desafinadamente
Guima com 14 anos e os primos Darcirene e Marcelino (este filho de criação de meus avós)
A folha seca cai na mata verdejante
E é levada bem distante
Do ramo em que nasceu
O meu destino e igual a folha seca
Por também me ver distante
De um amor que já foi meu
(Zé Fortuna. Folha Seca)
Desde cedo, meu pai — Dé da Farmácia — me ensinou a apreciar a música e poesia sertanejas, ele que na juventude participara do conjunto G. Machado e seus Rancheiros e sabia letras de modas, poemas e desafios caipiras.
De fato, anotei no meu livro de memórias Menino-Serelepe esta passagem ocorrida durante uma pescaria:
Dé da Farmácia, Dito da Mindica, Geraldo Machado...
Aguinhas musical (2) - G. Machado e seus Rancheiros
Aqui: https://guimaguinhas.prosaeverso.net/blog.php?idb=40488
ZÉ BATISTA, CONTADOR DE CAUSOS
Ai, seu moço, eu só quiria
Pra minha filicidade,
..........................
Pórva, espingarda e cutia,
Um facão fala-verdade
E uma viola de harmonia
Pra chorá minha sódade
(CORNÉLIO PIRES. Ideal Caboclo)
Decorei muitas daquelas letras que meu pai me ensinou e as transcrevia no caderno de capa azul para cantar em parceria com meu avô — que os netos tratavam por Pai Véio.
As poesias, eu as retirava de uma coleção estudantil que havia na biblioteca do ginásio.
Sentava diante do meu avô e impostava a voz para declamar Castro Alves ou Catullo — ou imitava o falar caipira para recitar os versos de Cornélio Pires...
Uma das tantas cenas inesquecíveis que passei com meu avô!
[*] Costumava recitar versos de Catullo pra Celeste, e ela me perguntava onde eu aprendera "aquilo"...
Pai Véio, um contador de histórias. Aqui: https://guimaguinhas.prosaeverso.net/visualizar.php?idt=4179666
Zé Batista, o Pai Véio — um velho roge [*]
[*] De Rodger, marca de cutelaria inglesa. Bom, excelente, corajoso. Cabra roge = de tutano)
Meu avó Zé Batista era mesmo fã de Cornélio Pires, de tal modo que o incluí como personagem do meu livro A GUERRA DAS ESPINGARDINHAS (aqui) e escrevi a passagem acima. Essa viagem a Cambuquira de fato ocorreu.
Quanto às letras de músicas, eu as colhia num rádio gravador Aiwa, usado, que havia comprado ao Zé Elias Simes. Eu gravava as músicas e depois as repassava no avança/para do cassete, inclusive as "traduções" feitas por Hélio Ribeiro, na Rádio Bandeirantes.
E assim se deu que dois boleros nunca saíram de minha memória...
E durante 50 anos eu os cantarolei romanticamente para minha mulher, e, hoje, meses após sua desencarnação, dou a Volta do Lago, ora cantando, ora assoviando, ora "solfejando" (lá lára lálá nã nãnin nãnãná...) para mim mesmo (e para ela, em pensamento) estes dois inesquecíveis boleros: Historia de um Amor e O relógio.
E os dois — como é próprio deste gênero — inspirados na perda/ausência da mulher amada...
Confira:
Guima e Celeste, Volta do Lago de Lambari, 2022
Nilva Begido | ❤️❤️🌹| Instagram
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Cantoral compôs a canção em 1956, em Washington D.C., em frente ao Rio Potomac, ao final de uma turnê dos Los Tres Caballeros pelos Estados Unidos. Durante a turnê, ele teve um caso com uma das garotas que participava do show, que retornaria a Nova York na manhã seguinte. Este episódio amoroso, e a presença de um relógio de sala durante o último encontro, foram os eventos que inspiraram Cantoral, que logo transformaria o episódio relativamente trivial na história de um amor profundo. (Wikipedia)
Los Tres Caballeros - El Reloj
https://www.youtube.com/watch?v=8RWa_SEGiW4&list=RD8RWa_SEGiW4&start_radio=1
Sobre cantarolar para Celeste, veja também:
COLETÂNEA RECORDAÇÕES DO MEU BEM-QUERER